Insônia
- Saulo Marzochi
- 28 de jan. de 2016
- 2 min de leitura
Que inveja que tenho de minha mulher que dorme só de fechar os olhos, mais rápida do que um cão. E eu a base de maracugina, camomila, mulungo, valium e fenergan, sem conseguir apaziguar meus monstros. Minha mulher dorme tão rapidamente que se eu disser: “Durma bem... sonhe com os anjos”, ela seria capaz de dormir logo após o “durma bem”, e despertar no “sonho com os anjos”, reclamando porque eu a despertei, e que história é essa de anjo(?).
Não ha noite que eu não pense em minha morte. Ela me parece tão sem sentido, se no fundo me sinto eterno, me preocupando com o que acontecerá com o planeta Terra nos próximos 5 bilhões de anos. Terei algum tipo de consciência para um dia vagar entre as galáxias? E se cada ano passa como um sopro, e se sobrarem apenas 50 sopros para mim, isto é quase nada, dá tempo de viver? Tomara que seja o suficiente para me redimir das desgraças que causei, da estupidez com que tratei os outros, muito maior do que como fui tratado. Ao tentar dormir peço perdão até pelo chute que dei num gato, na infância, eu mal sabia que os gatos eram sagrados. Perdão pelo que fiz quando recebi um bilhete de amor de uma garota na sexta série, li em voz alta dando gargalhadas, enquanto ela chorava, é que eu nunca havia amado. Já tratei mal até os empregados, é que nunca havia trabalhado. Subjulguei, passando durante décadas pelo mesmo porteiro, que até hoje não sei o nome. Pelo que entendi até agora não se pode acumular nada da vida senão o aprendizado, que só se dá quando somos forçados a virar literalmente do avesso, sempre nos deparando com uma verdade diametralmente oposta ao que acreditávamos. Beleza na feiura, riqueza na pobreza e amizade surgida da inimizade são só alguns exemplos. A vida é justamente o instante em que descobrimos que estávamos redondamente enganados. Isso me faz lembrar de meu falecido colega Fabinho, que morreu de leucemia, ainda na casa dos vinte anos. Era gente boa, inteligente, e só marcava gol. Por muitos anos eu pensei, porque não sou como o Fabinho? É que a vida foi feita justamente para nós, as bestas quadradas, e os que não são - se vão, como um sopro.
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