O bullying é superlativizado por uns e menosprezado por outros
- Saulo Marzochi
- 21 de out. de 2017
- 3 min de leitura

Existem vários níveis de bullying, uns ocorrem de forma intensa em episódios mais isolados, outros são mais velados e crônicos, imperceptíveis ao olho nu, e daí a dificuldade dos professores em perceber nuanças em plena algazarra. Uns surtem muito mais efeito dos intimidadores sobre suas vítimas do que outros. Uns conseguem contê-lo e outros não. Uns precisam do próprio bullying para que cresçam, criando carapaça e instinto de sobrevivência, e é notável a semelhança das crianças com os macacos, pois que exibem mais comportamentos atávicos e herdados, do que noções adquiridas pela bagagem da vida.
Num grupo de macacos existe sempre algum que exibe uma diferença ou fragilidade. Os mais fortes, ou os que querem se autoafirmar para o bando, se impõe sobre os alvos mais fáceis, mais frágeis, que só tem duas opções: trocar de bando e ser vítima novamente do mesmo tipo de situação crônica, ou impor-se contra o mais forte e intimidador, derrotando-o. O intimidador também está em processo de evolução e crescimento, no fundo, está procurando limites. A verdade é que o macaco intimidador agradecerá se for finalmente golpeado. Se o macaco subjulgado conseguir derrotar o macacão mais forte, poderá vislumbrar subir de hierarquia, impressionando as fêmeas, e quem sabe, repetir o mesmo comportamento agressor, intimidando outros chimpanzés que julgar mais fracos.
Pessoas diferentes reagem a diferentes tipos de estímulos. Será que a sociedade está mais violenta, ou a humanidade sempre foi violenta e agora essa violência está apenas melhor documentada? Para muitos especialistas, a violência é inversamente proporcional ao nível de educação de cada região. Mas mesmo dentro da escola a violência se dá de forma explícita e velada. Os alunos sentem raiva, não tem como controlar, pois são mal gerenciados e alocados dentro de possíveis atividades engrandecedoras ou produtivas, e também são bombardeados pela violência cotidiana, real, virtual, e simbólica.
Estamos submetidos a uma cultura de violência que se agrava com a não responsabilização do aluno, da criança, do jovem. E do nada, essa responsabilidade, que nunca foi trabalhada, cai como um piano na cabeça de alguém. E vemos playboys grisalhos surtarem na rua, como se fossem adolescentes hormonais. Tudo isso porque eximiram a criança de todos os papéis, como se ensinar qualquer atividade fosse exploração do trabalho infantil, condicionando os menores a viver num mundo de ilusão, bobagem e fantasia.
A criança pode fazer o que quiser (até seus 18 anos!) que nada é culpa dela. É dos pais, da escola, do presidente da república, das organizações Globo... E nunca esteve tão na moda terceirizar responsabilidades. Então criamos crianças frágeis, como se fossem bebês, e adolescentes imprestáveis, como se fossem crianças. E tratamos os jovens adultos delinquentes, como se fossem adolescentes. E agora vejo o tal, playboy grisalho, dando um surto na locadora de vídeo, porque alugaram o filme que ele havia reservado. As pessoas estão loucas devido a uma falha no projeto pedagógico e familiar, aliada a um erro de projeto de Brasil. Tudo isto gera uma grande frustração coletiva, que se agrava com a falta de perspectiva, e o terrorismo é justamente a falta dessa perspectiva, a falta de futuro.
Ainda na mais tenra infância, aos seis anos de idade, desejava me suicidar e metralhar minha turma. Rezava para acordar morto no dia seguinte, pois se a vida era aquilo, ficaria inviável. Um dia, uns meninos bem mais velhos me bateram, roubaram minha carteira com dinheiro do lanche, e me jogaram numa lata de lixo cheia de abelhas. Tive a iniciativa de ir a diretoria pedir ajuda, mas não acreditaram em minha história, dizendo que o grande macaco intimidador era um bom menino, de comportamento exemplar, e que eu estava mentindo. Sem dinheiro, não podia lanchar e não me venderam fiado na cantina, ficando com fome o dia inteiro. Um verdadeiro absurdo, e ficou por isso mesmo. Nas semanas seguintes fui para a escola carregando uma faca, minha vontade era de matar aquele garoto, o que planejou tudo e ficou com minha carteira. Então, quando acontece um massacre numa escola, tal como ocorreu Columbine, pode parecer absurdo, mas não fico nem um pouco chocado. É até mesmo previsível, e é justamente o que aconteceria se déssemos metralhadoras aos macacos.
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